Decapando até debaixo d'água (Local: Palhoça, SC; foto: L. Duran, 2008)

terça-feira, 8 de maio de 2012

O naufrágio do Recreio (1971): sucata ou sítio arqueológico?

Os vestígios do navio Recreio, encalhado em Santos, são sucata ou um sítio arqueológico de naufrágio? Essa pergunta simples é, na verdade, de difícil resposta.
O Recreio foi um navio-boate (sim, um navio sem motor preparado para festas!) que, em 1971, durante um forte temporal, rompeu suas amarras e acabou encalhando próximo ao Canal 6. Um ano e meio depois foi parcialmente desmontado, dinamitado e arrastado para fora da praia diante da estupefação e do alivio dos santistas.
O Recreio, encalhado em Santos (1971). Extraído do site Novo Milênio: http://www.novomilenio.inf.br/santos/fotos267.htm em 08/05/2012.
A operação de remoção, entretanto, deixou parte da estrutura do casco enterrada na areia. Com a erosão da praia, segundo artigo publicado no Almanaque de Santos (IHGS/ Sabesp, ano 1, nº 3, 2011), a partir de 1999 os destroços remanescentes, desenterrados, passaram a vitimar os banhistas. Anos mais tarde o local foi sinalizado e a prefeitura, em 2006 começou a remover pedaços de metal nas marés baixas.
Até aqui não haveria o porquê do questionamento da remoção do restante do casco do navio: ele causa problemas à balneabilidade daquele trecho da praia. Mas é a história pregressa do Recreio que provoca um segundo olhar sobre essa ação.
O navio iniciou seus trabalhos como Carl Hoepcke, mandado construir pela Empresa de Nacional de Navegação Hoepcke, na Alemanha, em 1926. A sofisticada embarcação serviu à empresa catarinense de 1927 a 1960, época em que realizou a cabotagem entre os portos de Santa Catarina e o Rio de Janeiro.
 O Carl Hoepcke em Florianópolis. Extraído do site do Instituto C. Hoepcke em 08/05/2012 http://www.hoepcke.com.br/instituto/foto02.htm

A navegação era, então, a melhor maneira de realizar a derrota, de forma que tanto passageiros humildes, quanto passageiros proeminentes no cenário político e econômico brasileiro foram transportados pelo Carl Hoepcke, o que faz da nave um ícone na história catarinense. Assim, o Instituto Carl Hoepcke, segundo o já mencionado artigo do Almanaque, pleiteia a doação do leme do navio que, contudo, continua armazenado em um galpão em Santos.
Minha opinião é a de que o resto da embarcação é claramente um sítio arqueológico de naufrágio que, no entanto, deveria ter seu perímetro de alguma forma melhor delimitado e sinalizado, evitando que os banhistas se machuquem e que, ao mesmo tempo, permita que o público possa usufruir de um espaço musealizado. Não seria mais uma interessante atração cultural um naufrágio de um navio dos anos 1920, acessível a quem não mergulha, situado próximo ao Aquário, ao Museu de Pesca, diante do fortim da praia do Góis e da fortaleza da Barra Grande?
Foi com essa ideia em mente que, no último dia 06 de maio, por volta das 9h da manhã, no pico da maré vazante, eu, Daniela Damo, Luciana Bozzo Alves, Lucas Troncoso, Cristiane Eugênia Amarante e sua filha, a pequena Mariana, realizamos um raid aos restos metálicos do Recreio, buscando fazer medições básicas com trena e registros fotográficos que servissem para uma discussão futura da importância dos vestígios.
Luciana e Lucas medindo os vestígios do Recreio. Estão espalhados por aproximadamente 23 m de faixa de areia.

Detalhe do fundo do casco e das cavernas.

Independe da ruína do Recreio ser considerada sucata ou sítio arqueológico, ela certamente merece uma abordagem arqueológica, ou seja, sua proteção ou demolição deveria ser acompanhada e registrada por arqueólogos antes, durante e depois de qualquer ação.


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